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Universo Nintendo

Análise – Resident Evil

Resident Evil, lançado em 2002, marcou o início de uma era na qual a Capcom e a Nintendo entraram em acordo para tornar a série principal da franquia exclusiva do Gamecube. O objetivo era trazer todos os três primeiros jogos, sendo o primeiro um ramake completo, e desenvolver dois novos títulos, uma prequela e o tão esperado quarto capitulo. 

Enquanto que tudo isso realmente aconteceu, os jogos foram perdendo a exclusividade e aos poucos saindo em praticamente todas as plataformas existentes, incluindo recebendo versões remasterizadas em alta definição. Este mês, no entanto, tais jogos “voltaram para casa” e agora estão disponíveis no Switch. Nesta análise vamos focar no primeiro deles e ver as mudanças agregadas nestes 17 anos.

O ápice da sobrevivência

Eu não sou nenhum estranho à primeira aventura da série. Joguei bastante no Playstation e quando comprei um Gamecube não pensei duas vezes antes de pega-lo lá também. Não satisfeito, ainda comprei o Deadly Silence junto com meu DS, em 2006. O motivo para fazer isso?  Este jogo é simplesmente perfeito, uma aula de como desenvolver um produto bem projetado e definitivamente não perdeu suas qualidades com o tempo.

Para os que não estão familiarizados, Resident Evil foi um dos jogos da primeira leva do gênero Horror de Sobrevivência. A característica principal desse tipo de jogo é tornar o jogador vulnerável, onde as adversidades que ele/ela enfrenta são bem maiores que suas habilidades. Aqui o jogador se encontra preso numa mansão infestada de zumbis, onde munição é escassa e os inimigos são muito resistentes. O combate não é o foco, inclusive é melhor ser evitado, mas sim os quebra cabeças, que vão desde o gerenciamento de recursos até os mais elaborados mecanismos dos cenários.

A estória é bem simples, afinal a narrativa segue a estrutura de um filme de terror de baixo orçamento dos anos 80. Tudo é proposital, desde as revelações óbvias até os diálogos forçados, e é o tipo de coisa que dá tanta personalidade ao jogo. 

Onde Resident Evil sobressai é justamente na atmosfera e no ritmo da aventura. E é essa atmosfera, e as diversas técnicas usadas para construi-la, que realmente roubam a cena. A mansão é misteriosa, cheia de gente morta, mas ao mesmo tempo cheia de vida. Espalhados por diversos cômodos estão documentos escritos pelos moradores antes de terem um fim trágico, e é desta forma que o jogo conta uma narrativa que não está presente nas inúmeras cutscenes. O grosso da estória aqui já aconteceu e é fascinante ligar o que está escrito com o cenário ao redor, a fim de reconstruir os últimos dias dos seus residentes.

E que cenários detalhados. É verdade que quase tudo é pré renderizado, mas não vejo problema nenhum quando o resultado é nesse nível de qualidade. Todos os cômodos da mansão, do dormitório e do laboratório foram pensados nos mínimos detalhes. E o melhor: Tudo se funde perfeitamente com o modelo dos personagens e inimigos, coisa rara de se ver em jogos que empregam tal técnica. A direção de arte aqui é impecável e impressiona até hoje.

Mas é o ritmo de jogo que junta todos os nós. Retornar às salas já visitadas é corriqueiro, mas semelhante a grandes jogos que empregam a mesma técnica, como Super Metroid, não é algo monótono. Todos os três cenários do jogo são bastante contidos, sendo necessário apenas voltar para a mansão uma vez depois de concluir as atividades do dormitório para então seguir ao laboratório. O vai e vem será feito de forma bastante orgânica, inclusiva com diversas portas trancadas por um lado específico servindo de ponte para salas anteriores. Sempre que jogo imagino o trabalho meticuloso que foi para tornar tudo tão fluido e definitivamente valeu a pena.

Todo esse vai e vem é também meticulosamente intercalado com inimigos e quebra cabeças. Este último é um dos desafios mais marcantes, onde é necessário prestar atenção aos documentos encontrados durante o jogo e no seu próprio poder de observação para finalmente ter aquele momento “eureka” e desvendar o mistério. Claramente que não podemos esquecer dos chefes, que garantem batalhas marcantes e desafiadoras.

Se alguém me pergunta quem é o personagem principal do jogo dificilmente penso em Jill ou Chris, ou qualquer outro membro do S.T.A.R.S., mas sim a mansão. A conexão do jogador com a ambientação é, de longe, o ponto do alto do jogo. É como se todos os seus elementos existissem para criar essa conexão, ao ponto do jogador conhecer tal casa tão bem quanto sua própria.

Por fim, jogar Resident Evil novamente é bastante prazeroso. Além de poder escolher entre dois personagens, cada um com uma estória diferente, também é possível conseguir até doze (!!) finais diferentes. O jogo ainda te incentiva a termina-lo o mais rápido possível, dando várias recompensas por isso. Mesmo sem tudo isso, jogar novamente ainda seria muito divertido por que o jogo em si é muito divertido.

Tecnicamente falando…

Se tem o um ponto que todo mundo menciona, e não estão errados, é que Resident Evil é um jogo surpreendentemente realista até nos dias de hoje. Em 2002, vindo de um Nintendo 64 e Dreamcast, o salto gráfico foi absurdo. Foi tão alto que até hoje o jogo consegue competir com títulos modernos.

Mais uma vez: Sim, o jogo é quase todo pré renderizado, mas isso não é algo ruim quando não há nada aqui que realmente necessite uma mudança de angulo de camera. Não me sinto limitado de forma alguma, muito pelo contrário, os ângulos dos cenários foram meticulosamente selecionados para tornar tudo fácil de navegar e aumentar a imersão. Mas este não é um pré renderizado comum, diversos elementos do cenário são dinâmicos, especialmente os que dizem respeito à iluminação. O trabalho incrível feito em 2002 foi trazido para o Switch com maestria.

E fico impressionado como a Capcom conseguiu adaptar tudo tão bem à alta definição, levando em consideração que o jogo foi pensado para rodar em 480p. O truque aqui foi usar algoritmos inteligentes para preencher elementos que não escalonaram com qualidade, mas também há um trabalho de modelagem por cima de tudo para ajudar a compor as cenas tais quais em 2002. Além disso, os elementos 3D também estão sendo renderizados em alta definição e eles se encaixam perfeitamente no cenário, incluindo interagindo sem nenhum problema com os efeitos de iluminação.

O resultado é muito bom e, vindo de alguém que jogou bastante o título original, posso afirmar que nada se perdeu na transição. E quando falo nada, eu estou incluindo até mesmos as cenas pré renderizadas, que são pouquíssimas e mantiveram uma qualidade supreendentemente boa, mesmo que não seja totalmente full HD. O único problema que vejo é o uso exagerado de um filtro de nitidez em certas partes dos cenário, que acaba causando um efeito de dithering acentuado.

Um cenário do jogo na proporção original.
Mesmo cenário do jogo cortado para ser encaixado numa tela widescreen.

Existe uma questão, no entanto, que merece ser mencionada: O tempo de carregamento. Ao contrário dos métodos usados para carregamento uniforme dos dias de hoje, Resident Evil (semelhante a jogos como Metroid Prime), secionam o mundo explorável em pequenas salas que só começam a carregar quando você decide abri-la. Como o jogo foi feito pensando apenas no Gamecube, todo o carregamento é feito durante a animação de abrir portas. O problema é que a versão de Switch não consegue carregar nesse intervalo de tempo, e isso resulta numa tela preta com um aviso de carregamento no canto inferior direito. 

Além de causar uma distração e tirar um pouco da tão importante imersão da experiencia, o efeito prolongado desse problema pode causar irritação quando é necessário fazer travessia prolongada pelas inúmeras salas do jogo. Pensando nisso, eu resolvi analisar o problema de perto e descobri que ele acontece de forma recorrente em apenas dois casos: O primeiro, em salas que conectam dois andares e fazem uso de escadas que não possuem animação própria (como o salão principal e o hall com as pinturas na escada), e o segundo em salas que podem ativar uma cutscene. De forma geral, não noto o problema em outras ocasiões, mas vale lembrar que isso talvez dependa do cartão SD no qual o jogo está instalado. No meu caso é um Sandisk Ultra (micro SDXC de 64 GB classe 10), o resultado desses testes pode variar a depender do cartão utilizado.

A novidade

Mesmo o trabalho de adaptação à alta definição tendo sido excelente, ainda há outras mudanças realizadas neste remaster. Comparado com o jogo original, temos uma nova dificuldade que torna o jogo mais fácil para iniciantes. Além disso, os modos Real Survivor (onde os baús não são conectados) e o Invisible Enemies (onde os inimigos são invisíveis) continuam presente para os que querem um desafio extra. Novas roupas baseadas em Resident Evil 5 também estão disponíveis, assim como uma seção de placar online, galeria de vídeos e conquistas.

Hoje em dias todas as telas que Resident Evil será jogado possuem formato 16:9, então houve um trabalho para enquadrar os planos originais e move-los juntamente com o personagem. O trabalho é bom e é totalmente ok jogar desta forma, mas há um modo 4:3 para os que querem realmente visualizar todo o trabalho de composição de cena do jogo original. Este é o modo que eu particularmente prefiro jogar, até porque é ela que gera a melhor qualidade de imagem, mas é ótimo que isso fique a cargo da preferencia pessoal do jogador.

Além disso, aqueles que não gostam dos controles “de tanque”, onde o analógico para frente sempre se refere à visão frontal do personagem e os movimentos laterais são realizados através de uma mudança de angulação, podem usufruir de um sistema mais tradicional. Eu particularmente achei estranho, mas isso talvez se deva a já estar acostumado com o original. Ainda sobre controles, a configuração padrão tenta imitar um shooter, com um botão de ombro para sacar a arma e outro para atirar. Eu não achei uma boa opção porque este não é o foco do jogo, então procurei opções mais tradicionais e fiquei feliz em encontra-las.

O preço desta mansão

Se você leu até aqui provavelmente espera uma recomendação unânime do jogo, mas… não é o caso. A Capcom está oferecendo Resident Evil no Switch por U$ 30,00 e eu devo dizer que achei o preço demasiadamente alto. Estamos falando de um port de um jogo lançado em 2014, que por sua vez é uma remasterização de um jogo lançado em 2002. Este mesmo jogo custa U$ 20,00 no PS4, um valor que faz bem mais sentido tendo em vista que é o mesmo cobrado por Okami (também da Capcom, também uma remasterização) no Switch.

O código do jogo foi disponibilizado pela Capcom e, portanto, não paguei por ele, mas não fosse este o caso provavelmente não o teria feito. O jogo é totalmente recomendado, caso não fatoremos o preço cobrado, então eu diria para não pensar duas vezes ao primeiro sinal de uma promoção. No valor atual, é melhor esperar mais um pouco.

Contagem regressiva

Resident Evil é o ápice dos jogos de horror de sobrevivência. Diversos títulos já o superaram em quesitos específicos, mas o conjunto da obra ainda se mantém, na minha opinião, intocado. Atmosfera impecável, ambientação marcante, personagens cativantes, game design extremamente bem atado e conteúdo na medida certa apenas contribui para tornar este um videogame perfeito. É apenas uma pena que a política de preços da Capcom não me permita recomenda-lo a todos.

ATENÇÃO: A nota dada é reflexo da experiência sem levar em consideração o valor do jogo. Mesmo levando uma nota alta, continuo não recomendando a compra no valor cobrado.

Jogo gentilmente cedido pela Capcom.

Game kindly provided by Capcom.

95%

Ótimo jogo, péssimo valor.

Uma aula de game design, mas o preço cobrado não condiz com um jogo de 17 anos atrás.

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