Rune Factory é uma franquia das mais famosas, e também das que mais teve altos e baixos recentes. Em busca de um caminho melhor pós fracasso do RF5, Rune Factory: Guardians of Azuma promete respirar novos ares a uma das melhores franquias de fazendinhas que existem.
Sobre Rune Factory: Guardians of Azuma
Era uma vez, num passado muito, muito distante, houve um jogo que foi precursos de todas as fazendinhas. A mãe de todas as fazendinhas. Talvez não o primeiro, mas é, sem dúvida, o mais influente de todos. Esse jogo se chamava Harvest Moon, e foi lançado para o Super Nintendo em 1996. Nele, você herdava a fazendinha do seu avô, e tinha que cultivar a plantação, cuidar dos animais e ter sucesso como dono de fazenda, além de cultivar relacionamentos com as pessoas da cidade.
Em algum momento da história, alguém decidiu acrescentar elementos de JRPG, aventura e exploração à fazendinha e vida social, e surgiu Rune Factory, spin-off the Harvest Moon, agora chamado de Story of Seasons.
O jogo foi muito bem recebido, e teve continuações, tendo cinco iterações numeradas, uns dois spin-offs e umas versões especiais. Infelizmente, porém, Rune Factory 5 teve péssima recepção, e poderia ter determinado o fim da franquia.
Entretanto, a Marvelous continuou seu desenvolvimento, e em 2021 começou a desenvolver um jogo chamado Project Dragon, que foi anunciado em 2023. Em 2025, o jogo foi anunciado com seu nome real, Rune Factory: Guardians of Azuma, e depois de um pequeno atraso, ele foi lançado no mês passado.
História
Azuma era uma terra próspera e cheia de vida, e Runas (que no mundo de Rune Factory, significa energia vital e magia, tudo junto e misturado), até que um grande impacto causou o Colapso Celestial. Com o Colapso, as Runas foram abandonando Azuma, e suas quatro grandes Vilas, Primavera, Verão, Outono e Inverno, foram perdendo vida, os deuses de cada estação perderam seus poderes, e o povo de Azuma foi espalhado, numa tentativa de sobrevivência entre uma terra morrendo e monstros espreitando a cada curva.
E tem um dragão preto com uma pessoa em cima atacando você, que está em cima de um dragão branco (ao menos, no sonho que começa o jogo).
Nesse cenário desolador, surge você, no papel de uma Dançarina ou Dançarino da Terra. Você tem o poder de dançar e trazer as coisas de volta à vida (mais ou menos como Amaterasu pode fazer em Okami). Usando seus poderes, você traz Ulalaka, a Deusa da Primavera, de volta à vida, e com a ajuda dela, tem como objetivo restaurar todos os deuses às suas antigas formas, para conseguir ajudar Azuma a viver mais uma vez.
Nesse processo, você vai conhecer muitas pessoas diferentes, e terá de dividir seu tempo entre tentar resolver a parada no planeta e cuidar das vilas, já que, na ausência de qualquer outra pessoa, e como você foi a pessoa que resolveu ressuscitar a deusa, é sua responsabilidade agora cuidar da vila. Das vilas, na real, porque a cada vila que você ressuscitar uma divindade, novas responsabilidades serão jogadas sobre seus ombros.
Você conseguirá manter todo mundo de todas as vilas feliz, com comida, casa e diversão, além de resolver os danos, trazer todos os deuses de volta à vida e recuperar Azuma do Colapso Celestial? Essa é sua missão em Rune Factory: Guardians of Azuma.
É uma história bastante intrigante, e se você não correr demais com ela, conseguirá ter bastante satisfação com o desenvolvimento. Há várias missões paralelas, especialmente de aproximação com as personagens, e elas ajudam a entender melhor o que acontece com Azuma e com seu povo, e também o que aconteceu antes.
Correr demais com a história vai te frustrar, porque há um momento em que ela começa a se tornar razoavelmente repetitiva para avançar, além de momentos que são travados por você não ter um nível específico de aproximação com alguém, então, cultive suas relações tanto quanto cultiva suas hortas (dependendo, até mais).
Jogabilidade
Aqui é o onde o coração do jogo está, de todas as formas possíveis e imagináveis. Rune Factory em si sempre foi uma franquia que equilibra várias coisas a fazer ao mesmo tempo. Quando isso é bem-feito, como no 3, o jogo te dá uma sensação incrível de satisfação e completude e tempo bem usado. Quando não é, como no 5, você sente que deixou um monte de tarefas pendentes, porque não consegue se focar direito em nenhuma delas, e acaba não fazendo nada direito, ou deixando muita coisa de lado.
Apesar de ser um spin-off, Rune Factory: Guardians of Azuma faz a distribuição de tarefas uma coisa bem mais satisfatória, e, o mais importante, opcional e personalizável.
Temos vários aspectos diferentes, então vou separá-los por categorias, e falar individualmente deles, e depois de como se integram.
Quem joga Rune Factory quer uma fazendinha, e o jogo entrega. Você pode plantar árvores, frutas, legumes e verduras em grande variedade, pode escolher exatamente onde vai ficar cada campo, e como será feita a sua colheita. Você pode usar suas Armas Sagradas para fazer a colheita crescer, ou para coletar imediatamente sementes, sem ter uma colheita, mas com chance de sementes de nível mais alto. Inclusive, falando em sementes, uma coisa muito legal aqui é que, caso você precise mover um pedaço de terra cultivável que tenha algo crescendo, você não perde seu plantio, recebe de volta as sementes, e só precisa plantar de novo quando terminar de reposicionar sua plantação. Isso ajuda a não precisar parar o fluxo de caixa da vila para poder deixar sua vila com sua cara.
E caso não queira se preocupar em fazer isso, pode designar pessoas que moram na sua vila para cuidar da colheita para você. É bem mais devagar do que você fazer, mas se você não estiver a fim de fazer, o dinheiro vai continuar entrando pra manter suas vilas.
Você pode também ter ranchos, e fazer amizades com monstros que geram todo tipo de itens extras, desde chifres até lã e ovos.
Além disso, você precisa coletar materiais para poder fazer suas construções. Você pode coletar conforme se aventura, mas também pode designar aldeões para fazer isso por você. Tudo o que for coletado por qualquer pessoa vai para as mesmas reservas, e você não precisa estar carregando as coisas para poder usá-las como material, basta ter em algum lugar. Isso facilita MUITO a vida na hora de criar construções e decorações.
O que não facilita nada, seja na hora de construir coisas ou de cozinhar é que as receitas não têm como ser organizadas. Mesmo que se dividam por categorias, às vezes, não fazem sentido dentro de si, e não dá pra colocar em ordem alfabética. Também é ruim que receitas necessárias para missões não ficam nem marcadas automaticamente, nem você pode manualmente selecionar receitas de prioridade.
A personalização aqui é muito grande, e você tem um modo no qual vê por cima, consegue visualizar, adicionar e retirar coisas muito facilmente, e isso inclui as alterações do terreno, como elevações, rios e cachoeiras.
Cada vila tem algumas áreas de desenvolvimento específicas, que são os lugares onde você pode dar seu toque pessoal. Mais vão abrindo conforme você avança o jogo. Como as estações do ano são permanentes de acordo com o nome de cada vila, você não pode mudar grande parte das vilas, e não há nenhuma alteração nas colheitas ou no ritmo das coisas. Você pode até mesmo plantar arroz no gelo da Vila de Inverno, que a colheita vai ser normal.
O seu dinheiro também é o dinheiro da vila. De todas as vilas que você for chefe no momento. Quando você for chefe das quatro vilas, Primavera, Verão, Outono e Inverno, terá que equillibrar a todo momento o quanto de dinheiro as vilas ganham, com suas lojas e produções, e o quanto de dinheiro precisa pra alimentar todo mundo, tendo de tomar cuidado para não terminar o dia com menos dinheiro do que o necessário, pois aldeões abandonarão suas vilas se passarem fome ou ficarem infelizes morando nelas.
Cumpra missões de cada vila constantemente para permanecer aumentando o nível delas, recuperando a vitalidade dos deuses que regem cada uma delas, e assim, sempre terá pessoas felizes trabalhando e vivendo com você.
Uma coisa que deixa a vila feliz é fazer festivais. De pesca, de colheita, entre outros, há várias opções. O problema aqui é que você marca os festivais quando quer, o que diminui a urgência de fazê-los, e eles são, genuinamente, fáceis demais e não parecem importar tanto.
Uma parte importante de Rune Factory são as aventuras que se vive. Aqui, cada região tem alguns monstros específicos, e alguns são apenas variações de outras cores de outros monstros. Você geralmente vai ter que ir do ponto A ao ponto B de alguma área fora das cidades para chegar a algum chefão, que terá que derrotar e, assim, avançar a história.
Aqui, você não combate solo. Pode montar uma equipe de mais 3 (e depois, mais 6) personagens, entre pessoas e monstros domesticados, e explorar o mundo na sua combinação favorita de combate. Pode levar gente porradeira, pode levar cura, pode levar buffs para vocês ou debuffs para os inimigos. Você monta sua aventura como quiser aqui, e quando ficar possível alternar entre as personagens, também pode mudar dependendo do tipo de inimigo que enfrentar, podendo, por exemplo, ter uma equipe para dano em área que acabe com vários monstros de uma vez, e outra de fundo com dano mais pesado e debuffs, para chefões de cada área (e acredite, você vai enfrentar vários chefões). Sair para o rolê com personagens também faz com que a proximidade de vocês aumente.
O combate é bastante diversificado, se você estiver jogando numa dificuldade um pouco mais alta. Na dificuldade História, tanto faz o que você fizer. De qualquer forma, você pode combinar como quiser as opções de armas primárias e secundárias, podendo optar por ataques mais próximos e fortes, mais ágeis e leves, ou mais seguros e distantes. Conforme avança a história, receberá novos Tesouros Divinos, que nada mais são que armas com poderes extras e/ou dano elemental, que também garantem alguns ataques especiais, e todas essa combinações adicionam profundidade a um combate que não teria tanto, de outra forma.
A montagem dos mapas é muito boa também. Há diversas formas de Pragas assolando Azuma, e conforme você vai pegando novas Armas Sagradas, você tem novas formas de abrir caminho, e, às vezes, vai ter que combinar duas ou mais Armas Sagradas para limpar uma área toda e conseguir acessar a próxima. Vários puzzles foram montados no jogo usando esses bloqueios, e o fato de você estar procurando pelo obstáculo enquanto luta contra monstros sem parar torna a experiência muito boa, especialmente porque os controles respondem muito bem aos comandos, mesmo nos momentos de maior intensidade.
Falando em mapa, você também pode explorar os céus de Azuma. Cada uma das ilhas, para além das necessárias para progresso na história, oferece novidades e surpresas. De uma baleia voadora a uma ilha de cogumelos, os céus de Azuma trazem tanta variedade quanto a terra, apesar de tamanhos menores.
Uma coisa muito legal deste jogo é que você ganha pontos de experiência gerais, mas também específicos: isso significa que quanto mais você usa uma arma, mais aumenta sua experiência em usá-la, e esses pontos específicos podem ser gastos, sozinhos ou combinados com os gerais, para aprender novas habilidades nas árvores de cada tipo de arma.
Essa variedade permite que você aborde cada jogada de uma forma diferente. Cada caminho pode ser sentido de maneira diferente, dependendo das armas que você decidir usar nele.
Falando na Árvore de Habilidades, tudo o que você faz neste jogo te dá experiência específica. Essa experiência pode ser gasta apenas nas habilidades que te fizeram ganhá-la, à exceção da experiência geral, que você recebe ao final de cada dia ao ir dormir.
Isso significa que se você quiser acelerar seu desenvolvimento de construções, precisa fazer mais construções. O mesmo vale para culinária, colheitas ou mesmo para as atividades sociais.
Falando em socialização, não existe Rune Factory sem ela. Aqui, há 16 opções de pessoas para namorar, casar e, se quiser, ter crias, e as opções não são limitadas ao gênero da personagem protagonista, diferente de outras versões: isso significa que, seja você ele ou ela aqui, qualquer solteirão ou solteirona está disponível (embora 2 deles só estejam disponíveis se você tiver uma das DLC).
Você pode casar-se e ter crias com apenas uma pessoa por vez, mas pode subir os níveis de amizade com todo mundo até o máximo, sem que isso cause um problema, os eventos não vão causar ataques de ciúme de ninguém. Mais que isso, você terá a opção de desfazer o casamento sem causar nenhum problema. Uma orbe te permite só agir como se os movimentos românticos entre você e a pessoa que casou nunca tivessem existido, mantém o nível de proximidade e amizade, e te permite casar com outra pessoa (desfazendo a existência de qualquer cria existente). Isso facilita muito pra quem quer ver todos os tipos de crias e relações possíveis, sem ter que jogar tudo de novo só para isso. Pode-se casar com todo mundo num save só, desfazendo e refazendo conforme quiser.
Para além da socialização romântica, todas as personagens do jogo oferecem muitas opções de interação legais. Todo mundo aqui é genuinamente cheio de profundidade, com tantas camadas quanto ogros e cebolas, e que faz você se importar. Além disso, socializar com as pessoas libera novas ações com elas, como elas poderem ir para o campo com você lutar, cozinhar com você ou entrar nos banhos de recuperação contigo. E em alguns momentos da história, você precisa ter um certo nível de amizade com algumas pessoas, ou você não consegue avançar. E quanto mais você socializar, mais pontos de socialização vai ter para gastar liberando novos eventos de socialização, rumo ao beijo que selará seu amor para sempre (até você resetá-lo). E quanto mais intimidade você tiver com as pessoas, mais informações delas você descobre.
Há muitos pontos de viagem rápida no jogo (e mais foram adicionados na atualização desta semana), o que torna fácil viajar de um lugar a outro, apesar de não dar para marcar seu destino.
Uma grande melhoria para este jogo é que há maneiras de passar o tempo sem precisar ficar sem fazer nada esperando. Você pode sentar-se a uma fogueira e escolher passar o tempo, e isso ajuda muito sua vida.
O pós-jogo (após terminar a história) não é muito profundo. Jogos anteriores não receberam DLCs de conteúdo extra real, e eu acho que seria muito bom se este título recebesse algum capítulo extra da história ou novas dungeons e formas de acessá-las. A maneira escolhida para liberar a última dungeon é questionável para mim (sem mais spoilers), e acho que poderíamos ter formas de aproveitar mais o conteúdo de fim de jogo, já que temos várias receitas de armas e equipamentos poderosos que não temos em que usar.
De qualquer forma, Rune Factory foi do lixo ao luxo. A série parecia fadada ao esquecimento depois de um desempenho OK com 3 e 4 e um fraquíssimo 5. Guardians of Azuma tem muita coisa de certo que pode ser aproveitado para o Rune Factory 6, e estou bastante otimista para o futuro da franquia agora.
Parte Técnica
Análise feita no Nintendo Switch, não no Nintendo Switch 2
Rune Factory: Guardians of Azuma é muito melhor desenvolvido que seu antecessor. Houve alguns momentos de quedas de frame rate, ou bugs visuais de inimigos sumindo, especialmente em situações de muita coisa acontecendo, mas, no geral, a experiência não é prejudicada o suficiente que torna o jogo feio ou que atrapalhe sua jogabilidade.
As telas de carregamento são de frequência média e duração no limite do aceitável, e essas devem ser as grandes diferenças em relação ao Switch 2.
Gosto das personagens e do seu design interessante e variado. Gosto, especialmente do fato de as mulheres não serem hipersexualizadas. Algumas são sensuais, sim, você tem, inclusive, a opção de colocar trajes de banho nas personagens e jogar assim, mas sem apelar, como alguns jogos com foco no público do JRPG costumam fazer. E não tem uma dragoa de 3000 anos num corpo de uma criança de 5, o que é outro ponto positivo num mundo com dragões peludos e deuses imortais.
Eu inicialmente estranhei o fato de ser um jogo com gráfico totalmente 3D, não um 2D no 3D, ou um 2.5D, ou qualquer combinação de sprites 2D em fundos 3D que vimos antes, mas conforme o tempo, você percebe que combina. O fato de terem escolhido o Japão Feudal como inspiração estética permite que o jogo seja bonito em toda a sua profundidade. Como cada vila tem a estética própria da estação, combinando com o período histórico escolhido, tudo é muito vivo e bonito aqui, muito bem feito. Mesmo que alguns mapas pareçam repetidos depois de você encará-los, há diferenças sutis o bastante para fazerem com que pareçam amplos, extensos e variados.
As texturas são melhores do que eu esperava, o que me faz crer que são ainda melhores na versão melhorada, mas o que me encantou verdadeiramente neste jogo foram as vozes. Praticamente todas as falas importantes do jogo são dubladas em inglês e japonês, e em ambos os idiomas, as personagens são ainda mais completas por causa das vozes, que casam perfeitamente com suas personalidades e maneirismos. Até mesmo os sotaques escolhidos são perfeitos.
A música do jogo é esquecível em sua maioria, mas agradável e não atrapalha em nada. Em diversos momentos, eu não precisei de música extra, a do jogo era suficiente para me manter atenta à aventura, e isso é raro.
Novamente, vou criticar o fato de não ter textos e legendas em português, mas a maioria de quem costuma jogar esses jogos não costuma se importar muito.
Conclusão
Rune Factory: Guardians of Azuma é um reencontro da franquia com o sucesso, e acena para um futuro promissor. Apesar de não ser perfeito, ele acerta em quase tudo o que se propõe a fazer, e é uma experiência muito bacana.
Análise feita com cópia gentilmente cedida pela Marvelous
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