Alguns adventures marcam época, como Grim Fandango e Full Throttle, que são lembrados até hoje, mas poucos games do gênero são portados para tantas plataformas como foi a criação de Benoît Sokal – Syberia.
Após ser um sucesso de vendas para a Microids em 2002, o game viu portes para o Xbox Clássico/X360, Playstation 2, Nintendo DS e contou com versões para o Nintendo Switch. Além de terem sido lançados separados, com as duas edições vendidas individualmente, o jogo também conta com uma versão em conjunto, que vem com alguns extras, denominado simplesmente de Syberia 1 & 2 (similar ao Syberia Collection lançado em 2009 para o Playstation 3) e é a versão usada para essa análise.
Um universo único
No papel da advogada Kate Walker, o jogador entra em um universo que só poderia ter vindo à luz pelo escritor Benoît Sokal (que, infelizmente, veio a falecer em 2021). Syberia 1 inicia-se na cidade de Valadilène, onde a protagonista Kate deve pegar a assinatura de Anna Voralberg, que está vendendo sua fábrica para acionistas estadunidenses devido ao acúmulo de contas atrasadas.
Porém, ao chegar na cidade, além de se deparar com a morte repentina da dona da fábrica (fique tranquilo que não é spoiler, essa é a primeira cena do jogo) Kate descobre que o irmão mais novo de Anna está vivo, impossibilitando assim o fechamento do contrato da venda. E aí começa a jornada da advogada, que embarca em uma aventura surpreendente, cheia de perigos e mistérios.
O charme da historia estão nos produtos produzidos pela fábrica Voralberg, que cria bonecos movidos à corda (autômatos) por séculos, um segredo passado de geração para geração na família, que chegam a tal complexidade a ponto de alguns terem pensamentos e desenvolverem sentimentos. Outro forte deste adventure é o clima de viagem, quase passando a sensação de um jogo de RPG. Parando de estação em estação, o jogador deve arranjar novas formas de fazer o trem seguir o seu curso e encontrar novos veículos.
Syberia 1 e 2 foi planejando como um jogo único, mas devido o tamanho (levando em consideração sua época, já que individualmente os jogos são bem curtos) o game acabou sendo dividido em 2, com o segundo Syberia sendo lançado em 2004 como uma sequência direta de onde termina o primeiro.
As cidades visitadas e os autômatos à base de corda em Syberia ajudam a criar uma atmosfera única no universo dos games da série. Sua história e o crescimento pessoal da personagem Kate Walker ao longo da aventura são um chamariz, levantando questões de pressão no trabalho, relacionamentos tóxicos e coragem para enfrentar o desconhecido; porém tudo de forma sutil, sempre mantendo o foco no aspecto da aventura e suspense.
Um mundo mágico que permanece visualmente bonito
Syberia de 2002 já era de encher os olhos visualmente, e é incrível como os cenários permanecem um colírio para os olhos depois de tanto tempo na tela do Switch, assim como na TV através do Dock. Os modelos dos personagens também continuam bonito quando jogado na forma portátil do console, mas na TV, é visivelmente notável como são simples os polígonos da protagonista e dos NPCs, apesar das texturas mais nítidas presentes nas versões mais recentes.
Syberia 2 (2004) possui a mesma beleza citada acima, mas os cenários perdem um pouco da qualidade gráfica, já que foram adicionadas cenas animadas ao cenário. Alguns personagens que fazem parte do fundo animado (ou seja, que não são modelos 3D) ficam fora de proporção, especialmente quando jogado na televisão.
Infelizmente o porte não corrigiu alguns problemas em relação aos objetos 3D que se encontram no cenário. Na vila Youkol, em Syberia 2, por exemplo, há um pedaço de pano que é quase imperceptível ao olho (isso até mesmo para e época!), que mostra que o porte foi só mais um (dos muitos) que foram somente adaptados, ao invés de corrigidos, para serem jogados nos consoles mais atuais.
Uma outra limitação é a impossibilidade de poder capturar vídeos do jogo para compartilhar nas redes, sendo possível somente capturar fotos. É uma escolha estranha para este porte, já que Syberia 3, que possui personagens mais detalhados e cenários com mais objetos 3D, possui essa opção.
Uma trilha sonora digna de aventura
Para cenários únicos e vislumbrantes, uma trilha sonora cinematográfica é mais do que necessária. E apesar de Dimitri Bodiansky e Nocholas Varley terem feito um bom trabalho em Syberia 1, é no segundo game que ficamos encantados. E não é para menos, a trilha sonora de Syberia 2 foi composta por ninguém menos que Inon Zur, o famoso compositor de jogos como Dragon Age e Fallout.
Outro grande diferencial são nas atuações das vozes. É muito comum ouvirmos diálogos fracos e falas irreais em games de Point & Click, em alguns casos removendo até a atmosfera do jogo. São poucos que alcançam o que Grim Fandango e Full Throttle realizaram. Syberia 1 e 2 fica ao lado deles, porém devido a algumas situações que parecem forçadas, fazem com que o diálogo perca um pouco da credibilidade da cena. Mas é importante ressaltar que esses momentos são extremamente raros.
Formas novas de jogar
Essa é a grande vantagem de ambos os Syberias na plataforma do Switch, em relação aos portes anteriores. Eu sempre fui fã de adventures, mas nunca gostei de jogar com mouse e teclado. E, no computador, como maioria dos jogos deste gênero eram jogados com o mouse (até mesmo pela nomenclatura – Point & Click) sempre foi algo que me afastou.
Quando o jogo foi portado para o Xbox clássico, a desenvolvedora inseriu a movimentação pelo analógico, passando uma sensação de estarmos controlando um game de Survivor Horror (porém sem o controle tanque, e sim um movimento 3D). Isso me reavivou a vontade de revisitar o game. No Nintendo Switch, os jogadores tem a vantagem de poder escolher como querem jogar de acordo com sua preferência: clicando na tela touch, como em um mouse, ou utilizando o controle. Além disso, ao usar o controle, ele trás diversas opções, assim agradando a todos os públicos que gostam deste gênero.
Outra grande vantagem de Syberia é que, apesar de ter alguns quebra-cabeças difíceis, nenhum deles é impossível ou muito complicado, quanto que a maioria dos adventures de Point & Click que foram lançados na época eram. Esse é provavelmente um dos pontos essenciais do sucesso do game quando foi lançado: é uma aventura fluída, com puzzles no ponto de dificuldade certo para não estragar a experiência.
Mas não negarei que seria bacana ter um Walkthrough (detonado) embutido no game, como muitos adventures têm feito ao portar seus jogos para novas plataformas, para ajudar naquelas partes da qual é natural empacarmos, como o já mencionado pano invisível no cenário que o jogador só encontra na sorte. O guia também seria bacana para ajudar a destravar as artes, que são extras (artworks realizados pelo próprio Sokal) que você desbloqueia conforme realiza certas ações no jogo. Algumas não consegui desbloquear e, mesmo com a linearidade do jogo, fica praticamente impossível dizer o que tem que ser feito para desbloqueá-la.
No mais, o jogo não traz nada inovador, além dos controles. Uma ação que mostrasse todos os objetos na tela para quem opta em jogar pelo controle (em ambos os Syberias), seria de grande valia.
Veredito
Syberia 1 & 2 continua lindo visualmente e sonoramente após todos esses anos. No Switch, traz todas as formas possíveis de jogar, seja clicando ou usando o controle, no portátil ou na Televisão. Mas, infelizmente, é só isso. Sem novos recursos no jogo ou um guia para ajudar as novas gerações, que estão mais habituadas com seleção de escolhas do que quebra-cabeças, dificilmente pode agradar novos jogadores. Agora, se você jogou no passado e gostaria de revisitar o clássico criado por Sokal, ou não finalizou na época e gostaria de dar mais uma chance ao game (como eu), a melhor forma é com o Nintendo Switch.
O jogo não se encontra na loja brasileira, porém o eShop americano faz promoções deste game com certa frequência. Se você gosta de adventures ou games com um visual encantador e histórias originais, Syberia não vai te deixar na mão.
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